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TRAMAS SOCIALES | Nº 02 | Año 02 | ISSN
2683-8095
11-28
Scarano, Medeiros Kruger, Jaques Ribeiro
Introdução
Tendo em vista que o espaço urbano congrega e
segrega diferentes grupos sociais, as políticas públicas e
os programas lançados pelos governos federais devem
ter como preocupação atender o direito à moradia
previsto na Carta Magna da nação. Na Constituição
Federal Brasileira de 1988, a moradia aparece enquanto
direito social no artigo 6º, juntamente com a educação,
o transporte, a segurança, entre outros. A mesma
constituição, em seu capítulo II, nos artigos 182 e 183,
trata dos objetivos da política urbana, cuja função é
“ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais
da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”
(Brasil, 2016, p.112). Outro ponto a se destacar, do
ponto de vista jurídico, é o Estatuto da Cidade, criado
pela Lei Federal nº 10.257. Nele, os artigos 182 e 183, da
Constituição Federal, que tratam da política urbana são
regulamentados. Em seu artigo 1º, o Estatuto da Cidade
apresenta-se como o instrumento que estabelece “as
normas de ordem pública e interesse social que regulam
o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo,
da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como
do equilíbrio ambiental” (Brasil, 2008, p. 15). Com o
objetivo de garantir o direito à moradia como um dos
direitos fundamentais da pessoa humana, a m de que
todos os cidadãos possam aceder às oportunidades
que a vida urbana oferece, o Estatuto da Cidade
aparece como um dos grandes marcos constitucionais
estabelecidos pela sociedade civil.
No entanto, se no âmbito jurídico possui-se ferramentas
necessárias para que o direito à moradia e os demais
direitos sociais sejam efetivados, na prática, a produção
do espaço urbano e os programas habitacionais têm
se mostrado com objetivos diferentes. A sociedade
brasileira é marcada por uma desigualdade social
e econômica. Nesse sentido, os direitos têm sido
percebidos como privilégios, aos quais poucos grupos
têm acesso.
A realidade urbana brasileira apresenta um cenário
desaador do ponto de vista da infraestrutura das
cidades e do ponto de vista habitacional, tais fatores
reetem a estrutura e a formação da sociedade
brasileira. Tal como sugere Marguti (2018), no Brasil,
por décadas, a trajetória das políticas habitacionais
visou produzir moradias para populações de baixa
renda além de atender às necessidades sociais de tais
populações. No entanto, tais políticas tiveram, ao longo
de seu percurso, mudanças que acabaram desviando
o atendimento para classes de renda média. Assim foi
o caso da política habitacional originada pelo Banco
Nacional de Habitação (BNH), criado em 1964, que tinha
como proposta atender prioritariamente famílias com
renda mensal entre 1 e 3 salários mínimos. Entretanto,
após a reformulação de tal política, tais famílias tiveram
os investimentos na área da habitação alterados
pela política. Após o término do período ditatorial, a
sociedade civil organizou-se em forma de movimentos
sociais, sindicatos, universidades e entidades
prossionais com o intuito de reivindicar políticas para
área da habitação, o que ocasionou o Movimento pela
Reforma Urbana.
As conquistas jurídicas, destacadas no texto acima,
fazem parte do período de redemocratização do país
que ocasionou a Constituição Federal do ano de 1988.
No entanto, os anos 1990 foram marcados pela agenda
neoliberal em diversos países latino-americanos. Nessa
situação, o Brasil não construiu nenhuma política
habitacional centralizada, ao contrário, a questão
habitacional teve como resposta as estratégias
encontradas por municípios e Estados. Somente a partir
de 2003 que a política habitacional voltou a ser uma
questão do Estado, através da sanção do Estatuto da
Cidade, Lei nº 10.257/2001 e da criação do Ministério
das Cidades (Marguti, 2018), encarregado de formular
a política urbana em nível nacional e fornecer o apoio
técnico e nanceiro a governos locais (ROLNIK, 2015).
Em 2004, foi lançado o Plano Nacional de Habitação
que, já em sua apresentação, ressaltava o objetivo de
“assegurar o acesso à moradia digna, à terra urbanizada,
à água potável, ao ambiente saudável e à mobilidade
com segurança” (Brasil, 2004, p.3). No entanto, aponta
Marguti (2018), o setor empresarial da sociedade
brasileira, atingido pela crise hipotecária ocorrida
nos Estados Unidos em 2008, propôs ao Ministério da